Os medicamentos monoclonais são relativamente novos no tratamento do câncer, embora alguns tenham sido disponibilizados desde o final dos anos 90. Atualmente, novos medicamentos ainda estão sendo desenvolvidos.
Como esses anticorpos funcionam?
Basicamente, quando o anticorpo se liga a uma célula cancerígena, ele pode:
- Tornar a célula maligna mais visível para o sistema imunológico;
- Bloquear sinais de crescimento;
- Impedir a formação de novos vasos sanguíneos que fornecem oxigênio e fatores de crescimento;
- Enviar radiação às células cancerígenas: neste caso, as partículas radioativas estão ligadas ao monoclonal, permitindo baixos níveis de radiação por um longo período de tempo;
- Enviar quimioterápicos às células cancerígenas: como acima, ligando as drogas quimioterápicas.
O Daratumumab (DARA)
O medicamento Daratumumab (DARA) é um anticorpo monoclonal (anti-CD38) utilizado no
tratamento de pacientes com Mieloma Múltiplo. O DARA tem como alvo o antígeno CD38 que é
altamente expresso nas células com mieloma, tornando-as mais visíveis ao sistema imune.
O CD38 é fracamente expresso nas hemácias normais. Assim, o anti-CD38 liga-se ao CD38 nas
hemácias-teste, causando panreatividade in vitro. As amostras dos pacientes em tratamento
com o DARA apresentam reações fracas nos Testes de Antiglobulina Indireto (TAI): Pesquisa e
Identificação de Anticorpos Irregulares e Prova Cruzada.
A aglutinação devido ao anti-CD38 pode ocorrer em todos os meios (como salina, LISS,
polietilenoglicol), e com todos os métodos em AGH (gel, tubo, fase sólida). Reações de
aglutinação causadas por anti-CD38 são geralmente fracas (1+), mas reações mais fortes (até
4+) podem ser observadas em algumas metodologias.
Como o DARA interfere nos testes de AGH:
Descrição de caso:
O LAC recebeu 7 amostras de pacientes em tratamento com o Daratumumab entre 06/2016 e
12/2017.
Os pacientes apresentaram características distintas conforme indicado na tabela abaixo:
Seguem os estudos de casos de 2 pacientes recebidos no LAC:
Em alguns casos, a interferência do anti-CD38 pode mascarar a presença de aloanticorpos clinicamente significantes.
Para eliminar a interferência do DARA no painel de identificação de anticorpos irregulares, uma solução simples é o tratamento das hemácias-teste com DTT, que destrói o antígeno CD38 evitando a reação com o anti-CD38 para então, realizar os TAIs.
Fenotipagem Estendida
É recomendado que o serviço de hemoterapia proceda, previamente às transfusões, as pesquisas imuno-hematológicas, como tipagem ABO, RhD, pesquisa de anticorpos irregulares, fenotipagem eritrocitária, e, eventualmente a genotipagem, para que posteriormente não ocorram atrasos no atendimento hemoterápico, além de evitar erros na identificação dos anticorpos irregulares por interferência do anti-CD38.
Considerações importantes:
- Como o tratamento com DTT destrói o antígeno Kell, unidades K-negativas devem ser fornecidas, a menos que o fenótipo do paciente seja conhecido previamente como K-positivo.
- Não pode ser afastada a presença dos anticorpos contra antígenos dos grupos sanguíneos que também são desnaturados ou enfraquecidos pelo DTT 0,2M, como o KELL, GE, LW, YT, KN, DO, LU, JMH, IN, CROM.
- Os estudos de adsorção utilizando tanto hemácias tratadas por ZZAP quanto não tratada , falham na remoção do anticorpo.
- Algumas células raras com fenótipo Lu(a-b-) não são reativas na presença do anti-CD38, o que potencialmente pode fornecer a falsa impressão de que o paciente tem um anticorpo relacionado ao sistema Lutheran.
- TAIs positivos podem ser observados por até seis meses após o descontinuidade do anti-CD38.
- O anti- D38 pode causar uma pequena diminuição na hemoglobina in vivo (~ 1 g/ dL), mas hemólise severa não foi observada entre os pacientes em tratamento.
- Como alternativa, a prova cruzada em AGH pode ser realizada usando hemácias dos doadores tratadas com DTT.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
Aerts, Paul. Bio-Rad Laboratories. Knowledge Articles. When monoclonal antibodies used as therapeutics in cancer treatment start to interfere with antibody screening & identification and cross matching. 2015.
Chapuy C. et al. Resolving the daratumumab interference with blood compatibility testing. Transfusion 2015;55:1545-1554.
Oostendorp et al. When blood transfusion medicine becomes complicated due to interference by monoclonal antibody therapy. Transfusion 2015;55:1555-1562.
AABB – Association Bulletin #16-02. Disponível em: https://www.aabb.org/programs/publications/bulletins/Documents/ab16-02.pdf