Por: Bárbara Du Rocher (Fiocruz-RJ / Explore Cytometry)
A citometria de fluxo é uma técnica extremamente versátil que, quando bem executada, pode nos fornecer respostas para inúmeras perguntas, como apresentado nesta publicação.
No entanto, quando mal executada, frequentemente leva a resultados não confiáveis, irreprodutíveis e inconsistentes, consequentemente, perde-se tempo e dinheiro, pois faz-se necessário repetir todo o procedimento. Assim, seguir critérios mínimos de boas práticas em citometria torna-se imperativo para a obtenção de dados robustos e reprodutíveis.
Quando falamos em boas práticas em citometria de fluxo precisamos primeiramente definir que tipo de citometria estamos falando: Aplicada ao diagnóstico clínico ou à pesquisa? Isso porque existem diferenças consideráveis entre estas duas aplicações, como por exemplo, o uso de marcadores de viabilidade e do FMO (que praticamente não são feitos no diagnóstico clínico) e a forma de se fazer titulação.
Reparem, não existe certo ou errado, existem necessidades específicas de cada uso. Na citometria aplicada ao diagnóstico hematológico, por exemplo, costumamos fazer marcações de 8 (Padrão EuroFlow) a 10 anticorpos, já que os citômetros clínicos aprovados para diagnóstico possuem menos parâmetros de detecção do que os citômetros de pesquisa e também por uma questão de custo/benefício. Além disso usa-se frequentemente sangue periférico ou medula óssea recentemente coletados como materiais biológicos para a realização dos exames e, portanto, com altíssima viabilidade celular.
Assim, neste cenário, o uso de marcadores de viabilidade torna-se menos necessário e torna-se mais importante destinar um canal de detecção do citômetro para detectar a expressão de alguma proteína que seja relevante para o diagnóstico, maximizando o poder de detecção da técnica.
Portanto, quando o assunto for boas práticas em citometria de fluxo, certifique-se primeiro de que tipo de citometria estamos falando, pois, cada uso tem sua particularidade e, portanto, seus controles específicos. Isso se aplica não só ao se comparar citometria clínica com citometria de pesquisa, como também é extremamente visível dentro dos diferentes ensaios que são feitos na citometria de fluxo aplicada à pesquisa.
Tenha sempre em mente que cada ensaio tem seus próprios controles de qualidade. No entanto, independente destas particularidades, alguns pontos são inegociáveis e são compartilhados por todos os ensaios de citometria de fluxo: manutenção do equipamento, desenho experimental e análise.
A manutenção do equipamento envolve frequentemente:
1. Visitas dos técnicos das empresas para a execução das manutenções preventivas e corretivas;
2. Checagem da performance do equipamento com beads apropriadas, sempre que o equipamento for ligado;
3. Limpezas do sistema hidrodinâmico do equipamento com periodicidade (em geral, mensalmente).
O desenho experimental é a parte mais complexa e que requer bastante conhecimento técnico. Nesta parte falamos sobre o desenho experimental em si, sobre o desenho do painel e sobre questões que devem ser analisadas caso a caso, como titulação de anticorpos, voltration/gaintration, uso de marcadores de viabilidade e controles que sumarizam um total de 8 etapas:
- Passo 1 – Sistema ótico do seu equipamento
- Passo 2 – Biologia das suas células/partículas de interesse
- Passo 3 – Antígenos de interesse
- Passo 4 – Fluorocromos dos seus anticorpos
- Passo 5 – Desenho seu painel
- Passo 6 – Marcadores de viabilidade
- Passo 7 – Titulação, voltration e gaintration
- Passo 8 – Controles
Para mais detalhes sobre esse fluxo, acesse o guia para montagem de painéis multicolor, disponível para download no linktree do Explore Cytometry (Link na referência bibliográfica).
Por fim, a análise é a última parte do processo e requer muita atenção. A recomendação é que ela seja executada sempre nesta ordem:
1. Checagem da matriz de compensação;
2. Checagem da escala dos gráficos;
3. Criação da estratégia de gate para remoção de eventos não necessários e /ou de baixa qualidade e
4. Criação da estratégia de gate para análise dos eventos de interesse.
Analisar a matriz de compensação gerada é de fundamental importância para o usuário se certificar de que as sobreposições de espectros foram devidamente detectadas e resolvidas. Sem uma certeza clara de que esta etapa está correta, não faz sentido avançar na análise dos dados.
Já a etapa de checagem da escala dos gráficos permite ao usuário alterá-la de forma que seus dados sejam mais bem visualizados e, normalmente, a escala bi-exponencial é a mais utilizada.
A remoção de eventos não necessários e de baixa qualidade é conseguida removendo grumos celulares e células não viáveis e utilizando o “gate tempo”, respectivamente.
Todas estas três etapas são de fundamental importância por assegurar que somente dados de alta qualidade serão levados para a etapa final (Análise dos eventos de interesse).
Por fim, a criação da estratégia de gate para análise dos eventos de interesse é uma etapa extremamente particular para cada tipo de experimento e, portanto, não existe uma recomendação padrão a ser seguida.
Sobre a criação de estratégia de gates, acompanhe as próximas publicações do Blog Ciências da Vida em parceria com o Explore Cytometry.

Pesquisadora-tecnologista em citometria de fluxo pela Fiocruz, RJ e fundadora do Explore Cytometry (@explorecytometry), plataforma de mídias sociais voltada para a divulgação da citometria de fluxo.
Referências bibliográficas
Silva, Bárbara Du Rocher D’Aguiar, Explore Cytometry Citometria de fluxo: 8 passos essenciais para você criar seu painel multicolor / Bárbara Du Rocher D’Aguiar Silva, Explore Cytometry. – 1ª edição – Rio de Janeiro, 2023. Download disponível no Linktree: https://linktr.ee/explorecytometry
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